O Espiritismo e a Homeopatia

Olney Leite Fontes

Samuel Hahnemann

Pretendemos abordar os aspectos mais importantes desta ciência, embora de forma resumida, mas suficiente para explicar os motivos pelos quais os seus medicamentos são prescritos com certa frequência por meio do receituário mediúnico pela espiritualidade amiga, principalmente no Brasil, bem como a existência de um bom número de médicos e farmacêuticos e de pacientes que são partidários tanto do Espiritismo quanto da Homeopatia.

A Homeopatia não é uma terapia espírita, já que foi criada por Samuel Hahnemann em 1796, portanto, sessenta e um anos antes da publicação do Livro dos Espíritos. Contudo, seus princípios e fundamentos revelam uma identidade de conceitos que aproximam-na do Espiritismo. Santo Agostinho, numa publicação da Revista Espírita de 1863, menciona que os medicamentos homeopáticos são substâncias espiritualizadas, ou seja, capazes de atuar nos diferentes aspectos da realidade humana: corpo, perispírito e espírito.

Cabe mencionar que Hahnemann, desencarnado em 1843, foi um dos mentores da Codificação Espírita. Encontramos suas contribuições no Evangelho Segundo o Espiritisimo e nas Obras Póstumas. Para entendermos a grandeza da missão a que estava destinado, este artigo terá o objetivo de apresentá-lo, a seguir, aos nossos leitores.

Christian Friedrich Samuel Hahnemann nasceu no dia 10 de abril de 1755, em Meissen. Finalizou seus estudos secundários nesta cidade alemã aos 20 anos, dominando fluentemente vários idiomas, entre eles o francês, italiano, inglês, espanhol, latim, grego, árabe e sírio. A seguir, em 1775, foi para Leipzig estudar Medicina e, para sustentar-se, ministrou aulas particulares de línguas estrangeiras e traduziu obras científicas para o alemão. Além de estudar as patologias e as doenças, Hahnemann pesquisou muito sobre as correntes filosóficas de sua época, em especial o vitalismo e o organicismo. Enquanto os vitalistas acreditavam na existência de um princípio vital, de uma força motriz que antecedia a atividade mecânica mantendo-a atuante, os organicistas acreditavam que as atividades vitais eram decorrentes da organização biológica. Para Hahnemann o princípio vital era causa, e não consequência, da estrutura orgânica. Portanto, ele era partidário do vitalismo. Após dois anos de estudos na Universidade de Leipzig, Hahnemann resolveu continuá-los em Viena, pois a escola dessa cidade austríaca proporcionava maior cabedal científico. Em 1779, Hahnemann recebeu o grau de doutor em Medicina na Universidade de Erlangen, Alemanha, após defender a tese intitulada "Considerações sobre as causas e o tratamento dos estados espasmódicos". Nesse mesmo ano foi eleito para a Academia de Ciências de Mongúcia. Pouco depois, publicou uma série de trabalhos nas áreas de Química e Medicina. Seu tratado de Matéria Médica, que versava sobre as propriedades medicinais das drogas, tornou-se o manual oficial da época. Além disso, foi o responsável pela sistematização da farmacopeia alemã.

Hahnemann não se fixava em nenhum lugar, sempre buscando novidades científicas e meios de ganhar a vida. Naquela época, a influência da ciência moderna na Medicina ainda era muito tímida, apesar do avanço do método científico nas outras áreas do saber. Entretanto, Hahnemann conhecia o método empírico-indutivo de Francis Bacon, o raciocínio analítico de René Descartes e, sobretudo, a física de Isaac Newton, conhecimentos importantes para a consolidação da ciência moderna. Embora vitalista, assim como Allan Kardec, Hahnemann defendia o racionalismo científico para o desenvolvimento do conhecimento humano.

Entre 1779 e 1787, Hahnemann residiu em várias cidades, conquistando enorme clientela e excelente reputação como médico e farmacologista. Em Dessau, frequentou a "Pharmacia" do boticário Haesseler, onde conheceu Johanna Henriette Leopoldine Küchler, com quem casou e teve onze filhos. Em Dresden, trabalhou como substituto do diretor de Saúde Pública. Nesse período, escreveu várias obras e artigos, em especial sobre Medicina, Química e Mineralogia, além das traduções que realizava rotineiramente. Hahnemann teceu várias críticas à Medicina da época, que se apoiava, basicamente, em sangrias, fórmulas complexas e medicamentos tóxicos para o tratamento das doenças. Abandonou a Medicina em 1787 por julgá-la empírica demais, destituída de bases racionais. Desiludido, escreveu a um de seus amigos: "Para mim, foi uma agonia estar sempre no escuro quando tinha de curar o doente e prescrever de acordo com essa ou aquela hipótese arbitrária... renunciei à prática da Medicina para não correr mais o risco de causar danos à saúde alheia e dediquei-me exclusivamente à química e às ocupações literárias". Para sobreviver, voltou a trabalhar como tradutor, passando a enfrentar grandes dificuldades financeiras. E foi realizando uma dessas traduções que Hahnemann teve uma importante intuição que o levou à criação da Homeopatia. Este momento importante da história da Homeopatia será descrito no próximo capítulo.

O Nascimento da Homeopatia

Após apresentar Samuel Hahnemann aos nossos leitores no primeiro texto da série "O Espiritismo e a Homeopatia", este artigo tem a pretensão de abordar o nascimento da Homeopatia.

Em 1790, ao traduzir a Matéria Médica, do médico escocês Willian Cullen, Hahnemann ficou indignado com o fato de esse autor atribuir a eficiência terapêutica da droga quina ao seu efeito tónico sobre o estómago do paciente acometido de malária. Não concordando com essa hipótese, resolveu fazer experiências ingerindo por vários dias certa quantidade de quina. Para sua surpresa passou a apresentar uma série de sintomas típicos de malária: esfriamento da ponta dos dedos dos pés e das mãos, fraqueza e sonolência, taquicardia, pulsação rápida, ansiedade e temor intoleráveis, pulsação na cabeça, rubor nas faces, sensação de entorpecimento, enfim, um quadro que trazia a aparência global da febre intermitente, em paroxismo de 3 a 4 horas de duração. Ao suspender o uso da quina sua saúde voltava à normalidade. Deveria haver, portanto, uma identidade entre a doença e a droga ingerida.

O resultado desse experimento chamou a atenção de Hahnemann para o adágio hipocrático similia similibus curantur (o semelhante será curado pelo semelhante), ou seja, uma droga reconhecidamente eficiente no tratamento da malária era capaz de produzir sintomas semelhantes aos da malária num indivíduo sadio. Em seguida, experimentou a quina em seus familiares e amigos, notando que o fenómeno se repetia. Passou a realizar experimentos com outras drogas, catalogando seus efeitos no organismo sadio.

A partir da compilação dos sinais e sintomas que essas substâncias provocavam no homem sadio, decidiu fazer novas observações, agora no homem doente, para confirmar se o princípio da similitude funcionava na prática. Ao atender pacientes, passou a prescrever drogas que produziam no homem sadio sintomas semelhantes aos dos enfermos para observar se ocorria o fenómeno da cura. Como a maioria dos resultados foi positiva, a hipótese de Hahnemann foi confirmada. A partir desse facto, reconheceu a necessidade da experimentação humana para poder prescrever cientificamente aos doentes os agentes terapêuticos capazes de curá-los.

Samuel Hahnemann foi quem, pela primeira vez, introduziu a pesquisa objetiva e sistemática aplicada à medicina, ao tomar como base fundamental para seus estudos a ação farmacológica das drogas sobre o homem sadio, para depois aplicá-las nos indivíduos doentes segundo o princípio da similitude. Isso tudo muito antes do estabelecimento da fisiopatologia experimental de Claude Bernard. Hahnemann procurou traduzir sua terapêutica e experimentos na terminologia e no modelo da racionalidade científica moderna, sem abrir mão de sua convicção vitalista.

De 1790 a 1796, Hahnemann experimentou numerosas substâncias, sempre em pessoas sadias, além de realizar extensa pesquisa na literatura médica sobre sinais e sintomas provocados por drogas tóxicas. Em 1796, no Jornal de Medicina Prática, dirigido por Hufeland, Hahnemann publicou seu primeiro trabalho sobre suas descobertas, denominado "Ensaio sobre um novo princípio para descobrir as propriedades curativas das substâncias medicinais, seguido de alguns comentários sobre os princípios admitidos até os nossos dias". Com a finalidade de diminuir os efeitos tóxicos e nocivos das drogas, adotou as doses infinitesimais (grandes diluições) para o tratamento de seus pacientes.

Após muitos estudos começou a fazer discípulos que o ajudaram a realizar as experimentações e a catalogar, nos mínimos detalhes, o poder farmacodinâmico e curativo das drogas testadas. Com isso, em 1805 publicou a primeira Matéria Médica Homeopática, com 27 substâncias ensaiadas. No mesmo ano editou o livro Esculápio na Balança, criticando a medicina europeia. Com essa obra, acusou a prática médica de ser ineficaz e enganosa, criando, com isso, numerosos inimigos.

Em 1810, Hahnemann editou a primeira edição de seu livro básico, Organon da Arte de Curar, no qual encontramos a doutrina homeopática e seus ensinamentos, bem como regras minuciosas para exame, entrevista e tratamento do paciente. Entre 1811 e 1826, publicou os 6 volumes da Matéria Médica Pura, com 1.777 páginas e 64 medicamentos experimentados. Em 1812, passou a proferir conferências na Universidade de Leipzig, levando sua doutrina para os alunos de medicina dessa instituição. Entusiasmados com o que aprendiam, esses alunos passaram a frequentar a casa de Hahnemann para aprofundar seus estudos e realizar experimentos homeopáticos. Após formarem-se médicos, acabaram difundindo a genial obra de Hahnemann. A reputação da Homeopatia cresceu rapidamente graças aos bons resultados obtidos, atraindo a atenção de médicos e pacientes de vários países do continente europeu.

O criador da Homeopatia conseguiu encontrar uma solução para a maioria das doenças tratadas por ele. Todavia, seu tratamento apresentava dificuldades diante das doenças crónicas, que reapareciam frequentemente com novos sintomas. Passou a pesquisar de forma exaustiva os casos crónicos reincidentes até encontrar a presença de um fator desencadeador desses processos denominado por ele de "miasma". Assim, em 1828, divulgou suas novas descobertas na obra As Doenças Crónicas. Esse livro, composto por 5 volumes, versa sobre a causa das doenças crónicas, junto com o estudo de uma série de novos medicamentos para o tratamento dessas doenças.

Hahnemann casou-se pela segunda vez aos 80 anos com uma jovem francesa de nome Marie Melanie Derville, com quem foi viver em Paris. Nessa cidade obteve permissão para exercer a medicina, onde conseguiu muito sucesso. Morreu aos 88 anos, no dia 2 de julho de 1843, cercado do mais nobre respeito e admiração pelo legado que deixou ao mundo científico: 21 livros e 25 traduções.

Hahnemann morou em Paris de 1835 a 1843 e está sepultado nesta cidade no mesmo cemitério em que se encontra o túmulo de Allan Kardec (cemitério do Père-Lachaise). Kardec desencarnou no dia 31 de março de 1869. Os túmulos desses dois homens notáveis são os mais visitados do cemitério do Père-Lachaise. Contudo, não se sabe se os dois tiveram algum contacto pessoal, enquanto encarnados. Tanto Hahnemann quanto Kardec eram admiradores do Mesmerismo (Magnetismo Animal). Hahnemann tratava de seus pacientes com medicamentos homeopáticos e passes magnéticos mesméricos, uma vez que a Homeopatia e o Magnetismo Animal apresentam fundamentação teórica semelhante, com base no vitalismo. Enquanto o Magnetismo Animal utiliza a energia vital humana, a Homeopatia utiliza a energia vital extraída de vegetais, animais e minerais por meio de uma farmacotécnica especial, chamada dinamização homeopática.

O Espírito Hahnemann proporcionou a seguinte comunicação ao codificador da Doutrina Espírita, conforme a Revista Espírita de 1863: "Fui o criador da renovação médica que penetra hoje até nas classes dos sectários da antiga medicina; unidos contra a homeopatia, criaram-lhe diques inumeráveis, exclamando: 'Não irás mais longe!'. A jovem medicina, triunfante, venceu todos esses obstáculos. O Espiritismo lhe será um poderoso auxiliar. Graças a ele, ela abandonará a tradição materialista que, há muito tempo, retardou o seu voo. A medicina disseca os corpos e deve também analisar a alma". Em uma outra comunicação, o Espírito Hahnemann disse a Kardec, de acordo com a Revista Espírita de 1867: "Magnetismo Animal e Espiritismo são duas partes de um mesmo todo, dois ramos de uma mesma ciência, que se completam e se explicam um pelo outro".

A Lei dos Semelhantes

Nos dois capítulos anteriores apresentamos aos leitores uma breve biografia do criador da Homeopatia (Samuel Hahnemann), os principais momentos do nascimento desta ciência e algumas de suas interfaces com a Doutrina Espírita. O objetivo do presente artigo é o de caracterizar o principal fundamento da Homeopatia: a lei dos semelhantes.

Também chamada de princípio da similitude ou da analogia, a lei dos semelhantes foi utilizada empiricamente na medicina desde tempos remotos. Hahnemann teve como precursores vários médicos, em especial Hipócrates e Paracelso, que por meio de suas obras difundiram a lei dos semelhantes. Todavia, foi Hahnemann o descobridor do seu mecanismo de aplicação e de sua utilização científica na cura dos doentes. A Lei dos semelhantes afirma o seguinte: Qualquer substância capaz de provocar determinados sintomas em seres humanos sadios e sensíveis, em doses adequadas, especialmente preparadas, é capaz de curar um enfermo que apresente quadro mórbido semelhante, com exceção das lesões irreversíveis.

Para melhor elucidar a lei dos semelhantes citaremos, a seguir, um exemplo bem simples de sua aplicação na prática médica. Suponhamos que um doente com úlcera gástrica, durante uma visita ao médico homeopata, afirme ter hemorragias frequentes, eventuais diarreias explosivas, gosto amargo na boca, sensação de sufocamento com falta de ar à noite, grande inquietude de espírito, ansiedade e muito medo da morte, diminuição da memória, além de queimações no estômago, que acalmam com o calor e pioram com o frio. Por serem análogos aos da ingestão de arsênico, tais sintomas sugerem ao médico a indicação de Arsenicum album, que o prescreverá em doses bem diminutas. Desse modo, para a aplicação da lei dos semelhantes, é necessário saber antecipadamente o que cada droga é capaz de provocar em indivíduos sadios.

Para a Homeopatia a única forma de conhecer de maneira confiável os efeitos farmacológicos de uma droga é experimentando-a no organismo humano sadio. Coube a Hahnemann, por meio do método experimental indutivo, pela análise minuciosa dos fenômenos, conferir ao princípio da semelhança o valor de uma lei natural. Quando administramos uma substância medicinal a um indivíduo e os sintomas resultantes são compilados, estamos a registrar as manifestações específicas do organismo diante da agressão proporcionada por tal substância. Desse modo, revela-se a farmacodinâmica da substância testada. Esta experimentação, conhecida como experimentação patogenética, é a base para a escolha de um medicamento, possibilitando dessa forma que as manifestações sintomáticas do doente e da substância medicinal se combinem, fortalecendo e estimulando os mecanismos de defesa, na direção da cura. Assim, a prescrição homeopática deve basear-se na comparação entre os sintomas apresentados pelo paciente e os sintomas que a droga a ser prescrita, sob a forma de medicamento, produziu em indivíduos sadios.

Para a Homeopatia, enfermidade é o resultado da reação insuficiente do organismo diante da doença. Assim, faz-se necessário estimular a reação orgânica para que esta possa sobrepujar a força da doença. Quando administramos uma droga que provoca sintomas semelhantes aos que o paciente está sentindo, observamos, em um primeiro momento, aumento transitório dos sintomas. Entretanto, com o fim do efeito farmacológico, notaremos um efeito biológico de sinal contrário, que é traduzido pela reação orgânica à droga. Como a droga e a doença provocam sintomas semelhantes, haverá aumento sincrônico da reação orgânica, que proporcionará a melhora ou a cura do paciente. Para evitar a piora inicial do paciente e estimular ainda mais a reação orgânica, os farmacêuticos lançam mão do processo de dinamização: diluições sucessivas de uma substância em numa mistura de água e álcool, seguidas de fortes agitações para liberar a energia medicamentosa. À medida que se eleva o grau da diluição homeopática mais profundamente o medicamento homeopático age no ser humano, nos diferentes níveis da realidade humana (física, vital, emocional e mental). Portanto, a indicação de um medicamento homeopático e o seu grau de diluição (potência medicamentosa) depende das características pessoais e reacionais do paciente, sejam elas físicas, vitais, emocionais ou mentais.

As afinidades entre a Doutrina Espírita e a Homeopatia estão centradas especialmente no caráter imponderável das diluições homeopáticas que encontram correspondência na realidade física, vital, perispirítica e espiritual do ser humano. As doses homeopáticas diluídas e potencializadas tem por objetivo diminuir o peso material das substâncias medicinais e obter diferentes níveis de energia. Enquanto a Homeopatia age no ser humano em seus diferentes níveis energéticos (corpo físico, princípio vital, perispírito e espírito), a alopatia age somente no corpo físico.

Saúde e doença

O principal ponto em comum entre o Espiritismo e a Homeopatia diz respeito ao conceito de força vital empregado por Hahnemann, o criador da Homeopatia, e ao conceito de princípio ou fluído vital, ou ainda, fluído magnético, exposto por Allan Kardec, o codificador da Doutrina Espírita. A conversão de muitos médicos e farmacêuticos homeopatas ao Espiritismo tem por motivo, na maioria dos casos, esses dois conceitos, que se assemelham. Além disso, tanto a Homeopatia quanto a Doutrina Espírita consideram o ser humano em seus aspetos material e imaterial. Para Hahnemann o corpo material deve à alma, que o anima, todas as suas sensações. Já a Doutrina Espírita considera esta função própria do perispírito, que é o intermediário entre o espírito e o corpo físico. Este artigo abordará, resumidamente, sobre a força vital/fluído vital e sobre o ser humano tridimensional, que pensa por meio de sua mente-espírito, que se emociona, através de seu aspeto emocional/perispirítico, e age por meio de seu corpo físico.

Embora se reconheça que o projeto morfogenético está contido nos ácidos nucleicos, muitas perguntas feitas pela ciência ainda não têm resposta. O DNA, responsável pela formação das proteínas, por exemplo, é ele próprio uma proteína. Como entender esse paradoxo? A ciência, mais recentemente, tem demonstrado o equívoco de quem pensa que fazendo pesquisas com moléculas e genes irá descobrir a origem da vida. A complexidade do fenômeno vital não pode ser desconsiderada. Ou seja, a realidade viva é indescritível com base apenas no reducionismo e no determinismo físico-químico da biologia molecular. Tanto a Homeopatia quanto o Espiritismo reconhecem que o erro que a maioria dos cientistas comete é o de trabalhar no âmbito da estrutura e acreditar que, conhecendo-a cada vez mais, um dia conhecerão a vida. Eles jamais conhecerão o que é a vida enquanto continuarem atentos apenas nos seus aspetos estruturais.

A Homeopatia concebe o fenômeno vital do ponto de vista filosófico. Segundo Hahnemann, a vida não pode ser revelada pelas leis físicas, que prevalecem somente sobre as substâncias inorgânicas: "As substâncias materiais que compõem o nosso organismo não seguem, em suas combinações vitais, as leis às quais se submetem as substâncias na sua condição inanimada; elas são reguladas pelas leis peculiares à vitalidade". O que a vida é, em sua essência, não é verificável pelo método científico. Ela só pode ser conhecida a partir de seus fenómenos e manifestações.

No Livro dos Espíritos, organizado por Kardec, a união do princípio vital com o corpo físico é a causa da animalização da matéria, ou seja, a vida é um efeito produzido pela ação de um agente imaterial sobre a matéria. Este agente, que tem por fonte o fluído universal, é o princípio vital que dá movimento e atividade aos seres orgânicos, e que os distingue da matéria inerte.

Os modelos conceituais nos quais a terapêutica homeopática e o Espiritismo se apoiam é de origem vitalista. Somente quando aceita-se a noção de um princípio de causalidade para a vida, fora das dimensões físicas habituais, concorda-se em considerá-lo um modelo tanto para a homeopatia quanto para o Espiritismo. Segundo esses modelos, a condição do organismo depende da saúde da vida que o anima. Assim, conclui-se que a doença consiste em uma condição alterada originalmente nas sensibilidades e funções vitais, independentemente de toda consideração química ou mecânica, ou seja, a origem primária das doenças está na perturbação da força vital, seja esta perturbação oriunda de eventos externos ao corpo físico (traumas físicos, drogas, alimentação de má qualidade, ambiente insalubre, etc.) ou de eventos internos (tristeza, ódio, egoísmo, incapacidade de perdoar, etc.). A Homeopatia e a Doutrina Espírita definem saúde como um estado de equilíbrio dinâmico que abrange as realidades física e psicomental dos indivíduos em suas interações com o ambiente natural e social.

Desse modo, além da afirmação da interdependência entre o organismo e o ambiente, a Homeopatia e o Espiritismo reconhecem a interdependência entre os processos psicomentais e o corpo e o papel integrador da força vital/fluído vital, nesse contexto. Concebe, desse modo, a doença como um processo que pode ter se iniciado nos níveis anímico/emocional e mental/espiritual dos indivíduos suscetíveis, que posteriormente se manifesta sob a forma de lesão orgânica. Uma vez que para a medicina moderna, alopática, o corpo físico é a única dimensão do organismo humano, o ponto inicial da doença é revelado quando se identificam essas lesões. Assim, o ponto final do adoecer para a Homeopatia e a Doutrina Espírita, em muitos casos, é o ponto inicial para a medicina alopática. Ou seja, enquanto para a Homeopatia e o Espiritismo a causa primária dos desequilíbrios pode advir de diferentes níveis da realidade humana, para a medicina alopática ela se situa no componente celular. Como consequência, tanto a Homeopatia quanto o Espiritismo podem privilegiar a prevenção ao atuar sobre os níveis emocional e mental alterados por meio do fortalecimento da força vital, atuando diretamente sobre esta ou sobre os meios invisíveis da realidade humana (alma/perispírito e mente/espírito).

Os meios de tratamento dos doentes utilizados tanto pela Homeopatia quanto pela Doutrina Espírita serão comentados no próximo artigo, e último, da série "Espiritismo e Homeopatia".

As Terapias

Tanto a Homeopatia quanto a Doutrina Espírita consideram o homem um ser multidimensional, integrado em seus aspectos físico, anímico e espiritual pela ação da força vital/fluído vital. Para ambas, as causas primárias das doenças têm por origem, na maioria das vezes, esses diferentes níveis da realidade humana, ou seja, o resultado do desequilíbrio dos elementos que constituem o ser humano tem, geralmente, por causa primária o comportamento inadequado do ser humano.

Tomemos como exemplo o indivíduo que desenvolve infeções bacterianas na garganta com certa frequência. Embora muitos indivíduos apresentem em suas mucosas bucais bactérias supostamente "causadoras" dessas infeções, nem todos desenvolvem doenças localizadas nessa região. O paciente poderá tomar antibióticos para exterminar as bactérias. Contudo, se o fator que desencadeou a enfermidade foi um problema emocional (raiva, rancor, tristeza etc.), responsável pelo enfraquecimento da vitalidade, ocorrerá apenas inibição dos sintomas, que retornarão mais tarde quando a flora bucal for restabelecida. Assim, para o tratamento ser totalmente eficaz deverá agir também sobre a causa do problema. As emoções negativas enfraquecem a vitalidade humana. A medicina ocidental não considera os sintomas emocionais que o paciente apresenta numa doença bacteriana. A antibioticoterapia é o tratamento de escolha. Essa conduta terapêutica é muito comum na alopatia, pois este sistema médico considera as doenças do ponto de vista do corpo físico. Ao considerar todos os níveis dinâmicos do organismo humano, os tratamentos homeopático e espírita levam certa vantagem sobre o alopático por evitar a paliação e agir curativamente. Dessa forma, com o restabelecimento da vitalidade, fica difícil as bactérias invadirem a mucosa da garganta.

Os homeopatas lançam mão do medicamento homeopático e os espíritas usam a fluidoterapia para equilibrar o ser humano em seus três níveis com o fortalecimento da força vital/princípio vital. Para estimular nossa vitalidade e, por consequência a saúde de nosso corpo físico, precisamos praticar exercícios físicos de forma regular, estimular o cérebro com atividades intelectuais, descansar o corpo e a mente por meio de um bom sono, evitar o uso de drogas (lícitas ou ilícitas), praticar atividades ao ar livre e em contato com a natureza, praticar atividades sociais construtivas e alimentar-se de forma saudável e balanceada. Portanto, necessitamos cuidar de nosso corpo físico, pois sem um corpo sadio, a alma (sede das emoções) não pode manifestar-se de forma plena e saudável em nossa dimensão material. Porém, mesmo que pratiquemos esses hábitos saudáveis de vida, ao não cuidarmos de nossos valores mais íntimos, as emoções negativas desgastam a força vital/fluído vital. Para controlar os nossos pensamentos e termos domínio sobre as nossas emoções precisamos vencer os nossos vícios e defeitos. O Espiritismo propõe a reforma íntima para a renovação de nossos valores, ou seja, devemos ter como padrão de conduta as orientações e exemplos de Jesus Cristo, o modelo e guia a ser seguido para uma vida mais feliz e saudável.

Uma vez que a reforma íntima não se faz de um dia para o outro, a exigir disciplina e vontade constantes, a misericórdia divina vem ao nosso auxílio, ao permitir o alívio das doenças por meio do fortalecimento da vitalidade. As energias sutis que mantém o equilíbrio do organismo são recompostas com a utilização de medicamentos homeopáticos, no caso da terapêutica homeopática, ou com passes magnéticos e água fluidificada, no caso do espiritismo.

Hahnemann revolucionou a ciência com a aplicação do método experimental na medicina para conhecer com detalhes a farmacodinâmica de uma droga antes de indicá-la ao ser humano doente de acordo com a lei dos semelhantes. Esta lei foi apresentada no terceiro artigo da presente série "Espiritismo e Homeopatia". Todavia, Hahnemann se preocupava com a intensidade das reações iniciais que uma droga provocava ao ser ingerida. Estas, dependendo da natureza do paciente, poderiam ser muito violentas. É importante mencionar que no início de sua carreira como homeopata, Hahnemann não usava as doses diluídas e "energizadas" pela dinamização. Ele empregava doses elevadas de medicamentos, sobretudo na forma de tintura. Assim, antes que o organismo doente começasse a reagir, ocorria uma agravação inicial dos sintomas, pelo somatório dos sintomas naturais provocados pela doença, com os sintomas artificiais provocados pelo medicamento. Isso era muito desagradável para o paciente, levando muitos deles a abandonar a terapêutica homeopática.

Com a finalidade de diminuir os efeitos negativos da agravação dos sintomas, Hahnemann realizou uma série de experiências, chegando a resultados extremamente interessantes. A princípio, empregou doses pequenas, diluindo os medicamentos em água ou álcool, de acordo com determinadas proporções. Entretanto, observou que se o medicamento não era forte o suficiente para produzir a agravação dos sintomas, não era capaz de promover satisfatoriamente a reação orgânica. Como os resultados não foram os esperados, continuou os experimentos. Além de diluir os medicamentos, passou a imprimir agitações violentas, chamadas por ele de sucussões. Hahnemann notou que, além da diminuição da agravação dos sintomas e dos efeitos tóxicos das altas doses, ocorria aumento da reação orgânica. A partir desse experimento, o criador da homeopatia passou a utilizar diluições infinitesimais e "energizadas" pelas fortes agitações que imprimia na manipulação dos medicamentos homeopáticos. Esse processo farmacotécnico, conhecido como dinamização, libera a energia medicamentosa e promove curas mais rápidas e suaves. A diluição das substâncias medicinais, sempre intercalada pelas sucussões, obedece a uma progressão geométrica, promovendo diminuição de sua concentração química e aumento de sua ação dinâmica, que estimula a reação do organismo na direção da cura.

Atualmente, a cura por meio da terapêutica dos semelhantes pode ser explicada com o conceito de homeostase – tendência que os organismos vivos apresentam de manter um estado de equilíbrio interno, apesar das variações do meio ambiente externo. Sob a ação de estresses internos e externos, o sistema nervoso pode modular o sistema imunológico por meio dos nervos e das glândulas. Cada hormónio da glândula pituitária posterior está sob o controle neuroendócrino do hipotálamo, que é a região do cérebro, que conecta o sistema nervoso ao sistema endócrino (liberador de neuro-hormónios), através da glândula pituitária. Sua secreção pode ser influenciada por estímulos vindos de outras glândulas distribuídas pelo corpo e por influências ambientais, ritmos do sono, estresse físico e emocional. Cabe mencionar que, segundo o espiritismo, os centros de forças (chakras), que são alimentados pelos fluídos vitais e que recebem influência do perispírito, estão ligados diretamente às glândulas, que são as responsáveis pela produção dos hormónios. Cada um desses hormónios tem efeito direto ou indireto na resposta imunológica e vice-versa. Essa comunicação provocada pelo sistema nervoso central proporciona uma melhora do sistema imunológico. Desse modo, existe uma vasta rede de comunicação pela qual o organismo age como um ser bio-psíquico-mental, por meio da fisiologia integrativa patrocinada pelo sistema neuroimunoendócrino.