Opinião

Existe fé espírita?

por Alexandre Mano (alexmano@gmail.com)

Para responder a esta questão, comecemos por considerar o que é fé. A Wikipedia define a fé como “a adesão de forma incondicional a uma hipótese que a pessoa passa a considerar como sendo uma verdade sem qualquer tipo de prova ou critério objetivo de verificação”. E isto de facto corresponde à definição corrente que utilizamos para este termo.

Kardec avançou que o Espiritismo é uma doutrina filosófica e uma ciência. No Livro dos Espíritos, sempre que menciona a religião, referencia outras crenças que não o Espiritismo. Mas que diz ele da fé? Por exemplo: “Fé inabalável só o é a que pode encarar frente a frente a razão, em todas as épocas da Humanidade.” (O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. XIX, item 7). Alguns comentadores entendem que nesta afirmação está a ideia de que o Espiritismo constrói-se sobre a fé. Eu não a leio assim. Vejamos: uma fé baseada na razão, na análise lógica dos factos, seria, por definição, qualquer outra coisa que não fé. Poderia ser uma conclusão ou uma observação. Mas se da razão deriva um conjunto de crenças, este conjunto não pode ser fé.

Mais: quando Kardec diz que “a fé encara a razão”, a conclusão mais lógica será que a fé precede a razão. Ou seja, primeiro interiorizamos a nossa crença; depois expomo-la à análise crítica. Depois, se ela resiste ao exame, teremos um resultado que pode continuar a ser considerado fé, porque, apesar de ela “passar” na prova do senso crítico e científico, nem por isso pode ser provada.

Por todas estas considerações, na minha opinião, o espírita tem de ter fé, mas não uma fé irrestrita em tudo o que o Espiritismo ensina. As manifestações dos espíritos, por exemplo, não são tema passível de fé. Qualquer pessoa que tenha estudado o caráter experimental do Espiritismo, e que não acredite estar a ser alvo de embuste, acaba por se convencer que elas são reais. Não há aqui qualquer necessidade de fé. Por outro lado, embora todos os espíritos esclarecidos afirmem que Deus existe e que, para o crente, as provas da Sua existência estejam em toda a parte, a divindade ainda é uma questão de fé. Apesar de todos os séculos que a Humanidade viveu e todos os sistemas religiosos e filosóficos que existiram e existem, não há uma “prova” física, científica e irrefutável da existência de Deus. E empiricamente já conclui que é bem mais fácil convencer alguém que os espíritos existem que mostrar a um ateu a existência de Deus. Enquanto no primeiro caso posso contar com vários êxitos, no segundo ainda estou a tentar converter alguém.

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